E quando o SUS não banca?
Menos de um ano depois de realizar seis audiências públicas para debater o Sistema Único de Saúde (SUS), o Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar hoje (17) uma lista de processos que envolvem disputas da União, estados ou municípios contra decisões judiciais que os obrigaram a arcar com o pagamento de procedimentos médicos e de medicamentos não fornecidos pelo SUS. Para o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, as decisões a serem tomadas servirão de parâmetro para a Justiça nos casos em que o paciente busca acesso ao tratamento indicado para sua doença. Na pauta da sessão plenária, estão listadas nove ações, todas de relatoria de Gilmar Mendes.
Foi ele quem convocou, no ano passado, as audiências que tiveram a participação de especialistas.
Todos os casos que devem ser analisados hoje já têm decisão liminar (provisória) em favor dos cidadãos. Nos processos, o Poder Executivo alega, em geral, interferência do Judiciário em assuntos de competência privativa. Na maior parte dos casos, os estados reclamam de lesão à ordem, despesas excessivas, além do risco do chamado efeito multiplicador das decisões.
Durante a audiência do STF, em abril de 2009, o então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, observou a característica tênue do embate entre o Estado e o cidadão. Na ocasião, ele alertou que os recursos são finitos e as necessidades, infinitas, o que significa que não se pode dar tudo a todos. Por outro lado, Souza ponderou que quem bate na porta do Estado pedindo medicamentos o faz porque o Estado lhe nega tal prestação.
Ao conceder liminares que, por enquanto, garantem ao cidadão o acesso a tratamentos caros, Gilmar Mendes citou o artigo 196 da Constituição Federal, que estabelece o direito à saúde como direito de todos e dever do Estado.
Em caráter liminar, o ministro manteve decisão da Justiça alagoana, que determinou que o governo bancasse o tratamento da paciente, por meio da compra do medicamento Mabthera, orçado em R$162 mil. O caso deve ser julgado hoje de forma definitiva pelos 11 ministros da Suprema Corte. O entendimento firmado em plenário poderá, em breve, resultar na formulação de uma súmula vinculante.
A sugestão foi apresentada pela Defensoria Pública Geral da União, que pede que seja expressa a responsabilidade solidária dos entes da federação para fornecer medicamentos e tratamentos. O órgão sugere ainda o bloqueio de recursos públicos, em último caso, para que o medicamento seja fornecido ao cidadão.
Após ouvir os depoimentos prestados pelos representantes dos diversos setores envolvidos, entendo ser necessário redimensionar a questão da judicialização do direito à saúde no Brasil, destacou Gilmar Mendes, em uma liminar negada à União e ao município de Fortaleza, em setembro do ano passado.
No caso em questão, que também deve ser julgado em definitivo hoje à tarde, uma jovem de 21 anos, portadora de uma doença neurodegenerativa rara, requer o direito de receber o medicamento Zavesca. O remédio é receitado para possibilitar um aumento de sobrevida. O preço mensal é de R$ 52 mil.
O medicamento não está entre os registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) . Nesse caso, a regra do SUS é a de não atender ao pleito do cidadão. No entanto, conforme observou Gilmar Mendes, na liminar, essa não é uma regra absoluta. Em casos excepcionais, a importação de medicamento não registrado poderá ser autorizada pela Anvisa, anotou o ministro. A Lei nº 9.782/99, que criou a Anvisa, permite que a agência dispense de registro medicamentos adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso de programas em saúde pública.
De acordo com a secretária-geral de da Advocacia-Geral da União, Grace Mendonça, a União terá de pagar, nesse caso, mais de R$ 600 mil em um ano. Grace sustenta a posição da AGU contrária ao custeio dos medicamentos de alto custo, pois, segundo ela, a prática gera um desequilíbrio em todo o sistema de saúde. A secretária, porém, destaca que a posição da União é a de jamais deixar de reconhecer o seu dever constitucional de assegurar o direito de acesso à saúde ao cidadão .
Brasília, 17 de março de 2010
Diego Abreu
Brasil Econômico/BR