Farmácias Vivas correm o risco de desaparecer
Medicamentos eficazes e baratos poderiam estar à disposição dos mais de dois milhões de fortalezenses através do Programa Farmácias Vivas, cujo objetivo principal é possibilitar a transferência de conhecimentos sobre as plantas medicinais, incentivando o cultivo destas nas comunidades para a criação de remédios. O problema é que o projeto está morrendo, principalmente, em Fortaleza.
Criado há mais de 20 anos pelo professor Francisco José de Abreu Matos, o programa enfrenta dificuldades para se manter desde a morte do seu fundador, em 2008. Até mesmo, o legado de pesquisas e descobertas deixado pelo farmacêutico corre o risco de se perder e assim não ser aproveitado por falta de incentivo dos poderes públicos. O acervo de Abreu Matos, localizado na Universidade Federal do Ceará (UFC), espaço onde também funciona o horto matriz do projeto, sobrevive hoje de doações.
Segundo Aida Matos, arquiteta e filha do pesquisador, há alguns anos Fortaleza chegou a ter mais de 30 Farmácias Vivas espalhadas por vários bairros e beneficiando centenas de pessoas. Contudo, há cerca de três anos, a situação vem piorando. Aida Matos enfatiza que o programa sobrevive em Fortaleza de uma maneira extremamente difícil. "A falta de apoio, em especial, da Prefeitura está acabando com o Farmácias Vivas, ação de importância indiscutível para a saúde pública, tanto no cuidado com a mesma quanto economicamente, já que os remédios fitoterápicos são muito mais baratos", destaca.
Importância
No horto matriz, estão à disposição 106 espécies de plantas com certificação botânica, sendo o único Banco de Germoplasma de Plantas Medicinais do Brasil, ou seja, o único horto com valor científico agregado, título que justifica a necessidade da sua preservação. Esta importância da iniciativa de Abreu Matos foi reconhecida nacional e internacionalmente. No Brasil, o Ministério da Saúde incorporou, em 2009, o programa no Sistema Único de Saúde (SUS).
Contudo, mesmo com este valor, o Farmácias Vivas está sendo colocado de lado, principalmente em Fortaleza. Mary Anne Medeiros Bandeira, coordenadora do projeto e supervisora do Núcleo de Fitoterápicos do Ceará (Nufito), afirma que o motivo principal para a situação é a descontinuidade política.
"Determinado político tem a iniciativa, mas os outros que assumem não continuam a ação. A triste consequência disso é o fim do projeto. Isso é uma luta nacional. Falta, no Ceará, uma integração entre os três governos, municipal, estadual e federal. Além disso, Fortaleza precisa de um olhar mais especial, de mais apoio", enfatiza.
Conforme Mary Anne Bandeira, em todo o País já foram instaladas mais de 70 Farmácias Vivas. No Ceará, ainda não há informações com relação à quantidade de hortos participantes do programa. Sabe-se, apenas, que na Capital cearense apenas uma Farmácia Viva está funcionando. O espaço, denominado Lúcia Gurgel é mantido pela Universidade de Fortaleza (Unifor) em parceria com a Prefeitura de Fortaleza.
"Boa parte das farmácias no Estado não sobreviveu, outras estão esperando que venha mais verba para serem melhores organizadas. A demanda de interessados pelo projeto é enorme, o problema é o incentivo que é mínimo. A ação ainda não morreu por completo, porque os funcionários lutam pela causa. Ainda é preciso investir, querer mais", destaca.
Ana Valesca Mendonça, chefe da Equipe de Medicamentos Fitoterápicos e Farmácia Viva da Secretária Municipal de Saúde (SMS), admite que o programa funciona, atualmente, com capacidade mínima, atendendo algumas unidades de saúde com demanda de medicamentos fitoterápicos. Dentre as dificuldades apontadas por ela está a falta de insumos, de funcionários, principalmente farmacêuticos, e de maior conscientização dos profissionais de saúde em relação ao programa.
Serviço
Na Unifor, a Farmácia Viva atende tanto a comunidade como os acadêmicos do curso de Farmácia. A professora da Universidade, Regina Cláudia de Matos, explica que tudo o que é produzido é enviado para a farmácia do Núcleo de Atenção Médica Integrada (Nami) com o objetivo de distribuir para a população.
Regina Cláudia informa que o espaço recebe, a cada semestre, uma média de 40 alunos que têm a oportunidade de acompanhar a produção dos remédios. "Além de ser um excelente laboratório para os estudantes, o projeto faz com que a Universidade se aproxime da população através da prestação de um serviço importante".