Senador faz alerta sobre os possíveis riscos venda de medicamentos fora das farmácias
O acesso da população aos medicamentos é um tema recorrente no Legislativo. No Senado, o Projeto de Lei 2.158/2023 propõe permitir a comercialização de medicamentos isentos de prescrição médica em estabelecimentos como supermercados. A proposta, no entanto, tem gerado controvérsias entre os senadores, com opiniões divididas quanto à sua viabilidade e segurança.
Relator do projeto, o senador Humberto Costa (PT-PE) criticou duramente a iniciativa. Em discurso no Plenário, em março, ele alertou para os riscos à saúde pública que poderiam decorrer da venda de medicamentos fora das farmácias. Médico e ex-ministro da Saúde, o parlamentar ressaltou que o Brasil já conta com aproximadamente 93 mil farmácias espalhadas por quase todos os municípios, o que, segundo ele, torna desnecessária a ampliação dos pontos de venda para locais sem controle técnico e orientação profissional.
— Hoje o Brasil registra uma média de seis intoxicações medicamentosas por hora. Diante de uma situação já tão dramática, esses projetos vêm para jogar gasolina na fogueira. Medicamentos são vendidos em promoções relâmpago, ao lado de pacotes de salgadinhos e refrigerantes, sem qualquer orientação profissional, sem farmacêutico, sem controle técnico. Isso não é liberdade de escolha, é "empurroterapia", é irresponsabilidade — declarou o senador.
Humberto também rebateu o argumento de que a venda em supermercados ampliaria o acesso aos medicamentos ou reduziria seus preços, classificando tal discurso como enganoso. Para ele, além de estimular a automedicação, a proposta ameaça a sobrevivência de pequenas farmácias, especialmente nas periferias e em cidades do interior.
É fato que o setor supermercadista tem intensificado sua atuação política para tentar viabilizar a venda de medicamentos isentos de prescrição (MIPs) fora das farmácias. Estão mobilizando suas redes, pressionando parlamentares e buscando passar uma narrativa equivocada, como se vender medicamentos fosse algo simples, como se o medicamento fosse uma simples mercadoria ou mero bem de consumo, desconsiderando completamente os riscos sanitários e o impacto devastador que isso trará para a saúde pública e para as farmácias brasileiras, sobretudo às de pequeno porte, localizadas fora dos grandes centros.
Durante a sessão, o presidente-executivo da Associação Brasileira do Comércio Farmacêutico (Abcfarma), Rafael Oliveira Espinhel, alertou que a liberação da venda de medicamentos em supermercados pode inviabilizar milhares de farmácias e postos de trabalho, comprometendo ainda mais o acesso da população à saúde.
Segundo Espinhel, a medida também pode resultar em um aumento nas intoxicações e maior pressão sobre o sistema público de saúde.
— A farmácia é muito mais do que um ponto de dispensação de medicamento; é um local onde você pode ter acessibilidade, orientação e cuidado. Não se trata apenas de um estabelecimento de comércio; é também uma unidade de saúde — destacou Espinhel.
A advogada Laura Schertel Mendes, especialista em direito civil, também participou do debate. Ela afirmou que permitir a venda de medicamentos isentos de prescrição fora das farmácias representa um risco à saúde pública, pois dificulta o controle sanitário e a fiscalização contra medicamentos falsificados.
Laura também chamou atenção para o impacto da baixa escolaridade e do analfabetismo funcional, que podem aumentar os riscos de uso inadequado dos medicamentos.
— É necessário que os medicamentos continuem a ser vendidos em farmácias, sempre com a assistência de um farmacêutico. Afinal, medicamentos não devem ser tratados como produtos de consumo comuns. Estamos lidando com bens relacionados diretamente à saúde dos consumidores, à saúde dos cidadãos brasileiros — enfatizou a advogada.
Para o senador Humberto Costa, a questão central da saúde no país não está na quantidade de farmácias, mas sim no atendimento especializado, o que não seria solucionado com a liberação da venda de medicamentos em supermercados. Ele também ressaltou que o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já se manifestaram contrariamente à proposta.
Estão atualmente em tramitação no Congresso Nacional, dois projetos de lei voltados à liberação da venda de medicamentos isentos de prescrição (MIPs) em mercados, supermercados e, inclusive, estabelecimentos similares, como conveniências, quitandas, bodegas e hotéis.
A liberação da venda de medicamentos em supermercados busca apenas o aumento do faturamento financeiro e aumento do volume de vendas das indústrias de medicamentos, em prejuízo à saúde pública com forte impacto ao Sistema Único de Saúde (SUS). Representa um grave retrocesso aos avanços da Lei nº 13.021/2014, que exige a presença do farmacêutico nos locais onde ocorre dispensação de medicamentos. O Conselho Federal de Farmácia tem convocado os farmacêuticos e a sociedade em geral à pressionarem deputados e senadores a se posicionarem contra os dois projetos e à favor da saúde pública.